Pensamentos Soltos: Samhain

Lamp pumpkin jack-o'-lantern de www.tOrange.us com alterações.


(Alguns pensamentos, considerações e devaneios a respeito desse sabbat /não, esse não é um post sobre como festejar o Samhain).

O Samhain demarca o ano novo celta, e o início da roda do ano, sim. Mas o que ele demarca e inicia em mim?


Para além das palavras, instruções e poemas escritos nos livros de Buckland, Valiente e Cunningham (livros que levo comigo para onde quer que eu vá), o Samhain se tornou muito mais do que uma celebração. Nessa época, lembro-me como é difícil dizer adeus e como precisamos esvaziar os bolsos, para depois enchê-los.

Toda vez que vejo as comemorações de ano novo, os fogos e os cumprimentos, ouço alguns amigos e conhecidos dizerem: um ano ficou para trás, agora é tudo novo. Essas mesmas pessoas continuam nos mesmos empregos, com os mesmos preconceitos e com a mesma rotina. Ok, o ano é novo, mas o que se torna novo em cada um de nós? Por que fomos ensinados a dizer: venha o teu reino, mas não nos movimentamos para que o reino se faça? Por que o comodismo pelas coisas estabelecidas nos controlam a ponto de nos esquecermos quem somos, o que queremos e o que buscamos? O Samhain sempre suscitou essas perguntas em mim. 

O Arcano Número 13, O Rio do Esquecimento e "Eu estou bem"


Quando alguém que amamos morre, ficamos em luto. Mas o luto não ocorre apenas na morte física: ocorre também ao fim de um relacionamento, na perda de emprego, no momento de dizer adeus aos amigos, na passagem da adolescência para a fase adulta, etc. O luto sempre foi uma ferramenta muito útil para nos recuperarmos de um término, uma etapa encerrada, um corte preciso e necessário. Tudo morre, a natureza morre, os animais morrem, você e eu morremos e Deus morre (o Samhain é sobre isso, não?). Isso é um lembrete da grande jornada: você, o louco, certamente quer chegar ao sol e ao mundo, mas antes terá de passar pela morte. Por uma mudança necessária, abandonar algo que não te serve mais, sentir o fluxo da natureza das coisas.

Pense em seu livro favorito ou em um objeto que jamais pode ser arrancado de seu domínio. Um dia você não precisará mais dele e ele seguirá o fluxo. O livro que você se nega a emprestar, aquela estátua maravilhosa que você trabalhou muito para conseguir, inclusive o seu corpo. Em um determinado momento, você terá de deixá-los, para receber algo ainda maior, ainda mais significativo - mas que agora, nesse momento, não fazem o menor sentido, tampouco lhe parece confortável a ideia de deixar seu ouro, seus tesouros, suas riquezas para trás. Mas você não poderá levá-los para além da morte. Isso mexe comigo, porque o Samhain me lembra que a vida acontece aqui e agora e que para além disso, existem mistérios no passado e no futuro para buscarmos.

O Rio do Esquecimento (Lete) tem sido um tema caro para esses tempos. Vejo, em diversos grupos, pessoas dizerem: alguém conhece um feitiço para esquecer? Para fazer a dor passar? Para acabar de vez com as lembranças? Daí, antes da celebração do Samhain me perguntei: se eu tivesse o poder de esquecer, o que eu me esqueceria? Nada. Simplesmente nada. Todas as dores, todas as lágrimas e todas as mágoas me tornaram a pessoa que sou hoje, e quer saber? Eu amo a pessoa que sou hoje. Amo de profundo coração e em profunda verdade. E cada lágrima, cada grito e cada acontecimento formaram a imagem que vejo no espelho. Aceitei que sou responsável por tudo aquilo que ocorre comigo e com as coisas ao meu redor. Não espero mais nada de ninguém, tampouco exijo coisas das pessoas como se elas me devessem algo. Não, elas não me devem nada. Vivo a vida de forma leve, serena e tranquila, sabendo que posso mudar o curso de todas as coisas quando e como quiser.

Eu não beberia de Lete, não beberia. Sobre o suicídio? Não beberia. Sobre o estupro? Não beberia. Sobre amar alguém do seu jeito e não saber apresentar esse amor? Não beberia. Os erros em minha estrada, os erros da minha jornada, os sapos que engoli (gíria que me foi apresentada por Larcks) foram necessários, ocorreram no momento certo e me tornaram o que sou hoje. Eu bebo todos os dias de Mnemósine. Os amores que doeram? Bebo. Meus fracassos? Bebo. As sementes que não germinaram? Bebo. Por que apenas assim, consigo lembrar dos amores que me levaram ao delírio, dos sucessos majestosos e das árvores que cresceram ao meu redor. Onde perdi um amor ganhei dois. Então, não vejo que perdi algo, vejo que passei por um processo necessário para conquistar algo novo.

Não queira esquecer, por favor. Esquecer é apagar sua história, sua memória, quem você é. Se aquela situação, sim, aquela que você tanto quer esquecer, fosse totalmente obliterada da sua mente, você seria a mesma pessoa? Por isso hoje amo com mais intensidade, como se aquele fosse o último momento. Escrevo uma poesia como se fosse a melhor e curto meus amigos, família e momentos como se jamais pudesse ter outro momento assim. Ao honrar minhas memórias, sei que honro meus antepassados (o Samhain não é sobre isso?).

Sempre me vangloriei por não mentir para as pessoas. Nossa, que pessoa tola eu era. Hoje me vanglorio por não mentir para mim. Não finjo que estou bem, porque sei que a jornada vai sempre em frente ou está sempre em movimento. Se hoje carrego um quilo nas costas, amanhã, quilômetros de distância de onde estava ontem, sentirei o peso de dez quilos. Então me esvazio quando é necessário, tiro tudo dos bolsos e torno tudo mais leve. A vida é mais divertida se for mais leve, sem culpa e sem medo. Aliás, isso bloqueia os chackras. Então hoje não digo que não minto. Digo que sou a verdade, a minha verdade, não a sua. Assim como sei que você É a sua própria verdade e isso é ótimo. O Samhain me fez encontrar com um lado que eu precisava: amo o meu sagrado, amo quem sou, amo o que faço. Mas preciso permitir que as outras pessoas também tenham e cultuem o seu sagrado, da forma que acharem melhor.

Se você leu o texto até aqui e viu os meus pensamentos soltos, imagino como você deve estar se sentindo. O Samhain no ano de marte chegou avassalador, ao ritmo de terremoto e fazendo a 'to ficando atoladinha'. R e l a x e! Apenas relaxe. Esse é um momento sombrio e escuro, onde você se prepara para encarar suas sombras. Encare-as. Com coragem, com afinco, como se sua vida e sanidade dependessem realmente disso! (E dependem mesmo, viu?),

Sim, coisas inesperadas ocorreram. Sim, são tempos difíceis. Sim, está impossível continuar de pé. Você sabe disso, eu sei disso, todos nós sabemos disso. Se você não encarar as doces sombras de seu interior e exterior, como poderá encarar a luz interior e exterior? Respire, tome um tempo para si e lembre-se sempre pelo que você é grato, ao invés de se martirizar diariamente e se sabotar, pensando no que podia ser melhor, no que poderia ter mudado... deixe o passado descansar um pouco. Parte do passado vive no presente e é AGORA que você pode mudar as coisas. O Samhain me lembra que algo morreu, deixei algo para trás, algo mudou. Eu fico triste... e alegre! Por que apenas depois de morto, poderei renascer. Apenas depois de deixar algo para trás, poderei encontrar algo pela frente. E apenas depois que algo mudar (no Brasil pedimos tanto por mudança mas não a vivemos nós mesmos, né?) algo mais aprimorado surgirá.

As bruxas conheciam a ciência antes dela se tornar ciência. A cura pelas ervas (curandeiras), imposição das mãos ou como trazer uma criança ao mundo (parteiras), são exemplos do domínio do oculto que depois a sagrada ciência disse: ok, isso funciona mesmo, parem de perseguir essas mulheres. As bruxas também conheciam a morte e pós-morte e a ciência hoje ainda não conseguiu responder algumas questões. E para compreender a morte, precisamos observar a vida, e mais: precisamos notar o que morre, como morre e se realmente acaba. Temos esse medo (que em meu caso vem das experiências cristãs), de que depois da morte seremos punidos, de que devemos nos comportar porque Deus vê, julga e pune tudo, de que o paraíso não foi feito para mim, mas para pessoas sem graça e sal, que emitem um discurso e fazem na prática as mesmas coisas que eu. Turn down for what! Minhas experiências com Perséfone e Hades me engrandecem ao perceber que o submundo, a minha sombra e coisas que ignoro, são magníficas. E como um personagem meu frisa em Encantados: o inferno não pode te queimar, se você fizer parte dele.

(Heustam [Lucas Oliveira] fez uma provocação interessante, sobre o parágrafo acima: buscamos o tempo todo compreender o sentido da vida, mas para entender a vida, precisamos estudar a morte. E como estudamos algo que temos medo?) Achei uma provocação pertinente e que veio na hora certa.

Enfim... Estou tão feliz! Fiz uma faxina caprichada em casa, mudei as coisas de lugar, mudei o wallpaper do meu notebook, mudei alguns hábitos alimentares e comportamentais, wow! Olho para o espelho e fico feliz pela minha força e pela minha morte. Mas ainda há tanto para mudar até o próximo sabbat! E eu mal posso esperar para renascer linda, poderosa e dygna!

O Samhain é sobre a lagarta. O casulo. A borboleta. A morte e por fim, o retorno da lagarta. E eu espero que você, que leu meus pensamentos soltos voltados para a torre do leste, seja uma maravilhosa lagarta logo em breve.

Siga em frente! Seja forte! Sinta o mundo! A natureza quer descansar e está pedindo para você se cobrar menos agora.

 Enquanto isso, celebre a morte e suas memórias, e principalmente, reconheça quando precisar de ajuda. Se precisar conversar com alguém, opte por falar (com a boca) e ouvir (pela voz), ok? Existem momentos em que palavras escritas não são tão eficazes em nos curar, então busque um amigo, um confidente, qualquer pessoa, para conversar, se abrir, chorar um pouco. E gostaria de lembrar que esses são MEUS pensamentos soltos, não uma verdade absoluta. São MINHAS considerações e não manual para tornar sua vida perfeita. É assim que tenho lidado e tenho absorvido as coisas para esse momento e é assim que tenho me mantido feliz.

E você? O que o Samhain te faz pensar? O que precisa deixar para trás? O que pesa em seus bolsos e não te serve mais?


Bençãos de Afrodite!

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